o mar do poeta

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sexta-feira, maio 25

MEMÓRIAS DE UMA AGENTE EM MACAU - PRENDA PARA GOVERNADOR

Tinha sido colocado no Terminal Marítimo do Porto Exterior havia pouco tempo e nessa manhã prestava serviço na Ponte pequena da companhia "Hong Kong Macao Hidrofoids". O Comandante da PMF tinha dado ordens para sermos rigorosos na passagem de revista aos passageiros e suas bagagens e já tinha castigado alguns agentes ali em serviço considerando-os negligentes.

Um casal chinês vindo de Hong kong transportava um enorme volume pelo que solicitei para o colocarem no balcão da mesa de revista para verificar o seu conteúdo.

A senhora não gosto do meu pedido e disse em inglês que eu era malcriado, o que tinha pedido filo no dialecto cantonense bem correctamente, que traduzido dá: "Minha senhora por favor coloque o embrulho que transporta aqui para ser revistado", esta frase nada tem de indelicado, mas enfim!...

O esposo agarrou então o volume, uma caixa enorme e com toda a força a lançou sobre o balcão indo atingir o peito da apalpadeira da PMF, já com certa idade. Apalpadeira, para quem não saiba era uma funcionária assalariada da PMF, mas não agente de polícia, que fazia serviços nas pontes cais de passageiros para passar revista a senhoras e ajudar na revista de bagagens.

O casal "barafustou" recusando-se a abrir a dita caixa, nem permitindo que nós o fizéssemos, e bastante isaltado pergotou-me se o não conhecia!

Respondendo-lhe que os não conhecia,  este, acto seguinte retirou da carteira um cartão de visita, que lançou sobre o balcão, tendo o mesmo caído no chão e eu não me dei ao trabalho de o apanhar, pedindo-lhe sim que se indentificasse mas a minha ordem não foi acatada, dizendo que a caixa que transportava era uma prenda para ofertar ao Senhor Governador de Macau e como tal se recusava a abrir.

Em fase dos factos solicietei a presença do Subchefe em serviço no Terminal Marítimo, que compareceu momentos depois para conversar com o casal, não mobtento quaisquer informações adicionais.

Em virtude da teimosia do casal o Subchefe solicitou, ao Comando uma viatura para levar o casal para o Comando para que na presença do Comandante ser abert o volume que tinha  a alegada prenda para o Governador.

Foi à força que entraram para o velho jeep, pois como pessoas importantes que diziam ser, não queriam entrar num jeep da Polícia, mas não tiveram outra alternativa., tendo a acção sido vista por dezenas de pessoas e alguns jornalistas.

Já no Comando recusaram-se igualmente a abrir o volume, tendo o Comandate da PMF lhes dado  ordem de prisão  e encarregou o Chefe de Dia ao Comando para redigir o respectivo auto de notícia e seguidamente eu os levar com o respectivo auto à Sede da Polícia Judiciária.

Lá fui, entregando os autos e o casal, mas o agente de serviço, ao ler o auto, recusou-se a aceitar o casal, devido ao facto de o auto estar mal redigido.

Regressei ao Comando da PMF com o casal, o Chefe de Dia tornou a redigir outro auto que foi assinado pelo Comandante da PMF e novamente segui para a sede da Polícia Judiciária onde entreguei de novo o auto e o casal bem como a caixa. ficando os mesmo detidos afim de serem presentes no dia seguinte a tribunal.

Nessa mesma noite com a ajuda de um advogado, o casal saía da prisão. No dia seguinte fui intimado a comparecer no tribunal. Os jornalista locais de língua chinesa deram imenso relevo aos acontecimentos e fizeram uma cobertura nas primeiras páginas sobre o caso.

Já no tribunal fui sujeito a um imenso interrogatório por parte do Juíz, parecendo até que o réu era eu! Perguntou o tempo que tinha de serviço na Polícia, se sabia falar inglês ou o dialecto cantonense. Pôs em causa os meus conhecimentos técnicos e profissionais dizendo-me até que tinha agido mal!

Enfim, outros tempos, quando a lei se aplicava em conformidade com as pessoas e seus interesses, o casal era conhecido e amigo do Juíz.

Perante o tribunal o casal foi obrigado a abrir o volume, que continha um conjunto de peças de jade bastantes preciosas e altamente valiosas, era esse o conteúdo do volume para ser ofertado ao Governador, em agradecimento de lhes ter sido permitir abrir na Ilha da Taipa uma fábrica de confecções.

O casal acabou por ser ilibado de qualquer sanção, tendo eu levado uma "caixa de charutos" dada pelo referido Juíz!

Dali para o futuro a minha posição não se alterou, continuando a ser rigoroso nas revistas, aprendi bem a lição e a lavagem de mãos de quem tinha dado a ordem de prisão.

Não tive receio do Juíz, pois a lei era para ser cumprida, independentemente de quem se tratasse, e fosse quem fosse.

Assim dizia a Lei, assim a aprendi e assim a continuaria a agir em conformidade.

O Governador não aceitou a prenda e até telefonou para o Comandante da PMF solicitando a minha presença no Palácio, o que o fiz no dia seguinte tendo sido recebido pelo Senhor Governador e este elogiou o trabalho que tinha efectuado e que se sentia triste pela forma como fui tratado no tribunal.

A imprensa chinesa sempre esteve a meu lado e criticou duramente todo o processo por parte do Juíz.

Na altura em Macau vivia-se um ambiente muito patriótico e esse casal milionário era natural de Taiwan, o que desagradava às associações comerciais e civicas de Macau.

Esta a minha primeira experiência com a justiça portuguesa em terras de Macau, é de assinalar que o Juíz era natrural de Macau bem como o advogado que defendeu o casal.


5 comentários:

Anônimo disse...

O episódio faz-me lembrar os anos 60/70's e uma frase que esteve em voga pela élite militar e nem só... VOÇÊ SABE COM QUEM É QUE ESTÁ A FALAR?!
Valdemar Alves

António Manuel Fontes Cambeta disse...

Estimado Amigo Valdemar,
Pois foi mesmo nos anos 70'que este casp se passou, mas continou assim em Macau muito para além do 25 de abril de 1974.
Abraço amigo e óptimo fim de semana.

Henrique António Pedro disse...

Episódios que, naqueles tempos, eram frequentes, com algumas nuances. Agora...bem, a parada subiu...
De aplaudir, contudo, o gesto do Governador cujo nome merece ser cuitado.

Abraço

António Manuel Fontes Cambeta disse...

Estimado Amigo e Ilustre Poeta Henrique Pedro,
Em Macau foi assim mesmo depois do 25 de abril de 1974 que só chegou a Macau quase dois anos depois.
Abraço amigo

Prof.Ms. João Paulo de Oliveira disse...

Estimado confrade e amigo António Cambeta!
Consegui acessar os comentários!!!
Mais tarde comentarei sobre as últimas crônicas, porque "forças ocultas" impediam os comentários...
Caloroso abraço! Saudações desconfiadas!
Até breve...
João Paulo de Oliveira
Diadema-SP